Merval e Mainardi: próximos de Serra e EUA


Não havia muitas dúvidas de que Merval Pereira e Diogo Mainardi fizeram de suas colunas (em “O Globo” e “Veja”) um espaço aberto a serviço de Serra, durante a campanha de 2010.

Mas não se sabia que eles cumpriram também o papel de correia de transmissão entre o serrismo e os EUA.

Textos publicados por Maria Frô e Miguel do Rosário no blog Gonzum mostram as relações estreitas entre os jornalistas e o Consulado dos EUA no Rio. Tudo baseado em telegramas do wikileaks, repassados com exclusividade a um grupo de blogs (entre os quais se encontra esse Escrevinhador).

Aqui, a tradução dos telegramas no blog da Maria Frô:

WikiLeaks
24) CABLEGATE DE HEARNE
246840/ 2/2/2010 19:13/ 10RIODEJANEIRO32/ Consulate Rio De Janeiro/ NCLASSIFIED//FOR OFFICIAL USE ONLY
Excertos dos itens “não classificados/para uso exclusivamente oficial” do telegrama 10RIODEJANEIRO32.

A íntegra do telegrama não está disponível.

ASSUNTO: Ideias sobre possíveis candidatos a vice-presidente para José Serra


RESUMO. 1. (SBU) Observadores políticos e atores do PSDB no país entendem que há possibilidade de candidato do PSDB à presidência (na dianteira, nas pesquisas de intenção de voto) convidar a candidata Marina Silva, do Partido Verde, para sua chapa, como vice-presidente. Embora pareça pouco provável, nesse ponto, que Marina Silva aceite esse papel, muitos creem que, pelo menos, ela apoiará Serra num eventual segundo turno contra a candidata do PT Dilma Rousseff. Apesar de a hipótese Marina não estar descartada, analistas do PSDB veem, como cenário mais provável, que o governador de Minas Gerais, Aecio Neves (PSDB) venha a completar a chapa com Serra, como candidato à vice-presidência, apesar de Neves já ter declarado publicamente que concorrerá ao Senado. Mas, com a vantagem de Serra encolhendo nas pesquisas recentes, ressurge a especulação de que Serra possa renunciar a favor de Neves como candidato do PSDB. Até aqui, Serra é o candidato mais provável, e muitos dos nossos interlocutores declararam que uma chapa Serra-Neves seria o melhor caminho para Serra enfrentar com chances de sucesso os esforços do presidente para traduzir sua popularidade pessoal em votos para Dilma Rousseff, na sucessão. FIM DO RESUMO.


NO RIO, ANALISTAS DISCUTEM ALTERNATIVAS PARA A VICE-PRESIDÊNCIA


2. (SBU) Em almoço privado dia 12 de janeiro, o importante colunista político da revista Veja Diogo Mainardi disse ao cônsul dos EUA no Rio de Janeiro que a recente coluna [de Mainardi] na qual propõe o nome de Marina Silva como vice-presidente na chapa de Serra foi baseada em conversa entre Serra e Mainardi, na qual Serra dissera que Marina Silva seria a “companheira de chapa de seus sonhos”.


Naquela conversa com Mainardi, Serra expôs as mesmas vantagens que, depois, Mainardi listou em sua coluna: a história de vida de Marina e as impecáveis credenciais de militante da esquerda, que contrabalançariam a atração pessoal que Lula exerce sobre os pobres no Brasil, e poriam Dilma Rouseff (PT) em desvanagem na esquerda, ao mesmo tempo em que ajudariam Serra a superar o peso da associação com o governo de Fernando Henrique Cardoso que Dilma espera usar como ponto de lança de ataque em sua campanha. Apesar disso, Mainardi não acredita que Marina associe-se a Serra, porque está interessada em fixar sua própria credibilidade, concorrendo, ela mesma, à presidência. Mas Mainardi disse que crê – como também Serra – que Marina Silva pode bem vir a apoiar Serra num eventual segundo turno contra Dilma.


3. (SBU) Em plano mais realista, Mainardi disse ao cônsul que o governador de Minas Gerais Aecio Neves dissera a Mainardi, no início desse mês, que Neves permanecia “completamente aberto” à possibilidade de concorrer como candidato a vice, na chapa de José Serra. (Nota: Dia 17/12/2009, Neves declarou oficialmente encerrada a discussão sobre sua pré-candidatura à presidência e mostrou interessem em concorrer como vice-presidente [referido em outro telegrama. FIM DA NOTA).


Apesar das declarações públicas de que concorrerá ao Senado, Mainardi disse que Neves planeja esperar um cenário no qual o PSDB, talvez à altura do mês de março, convide Neves para compor a chapa, com vistas a aumentar a chance do partido contra Dilma. As ambições pessoais de Neves e seu desejo, intimamente ligado àquelas ambições, de não atrapalhar o PSDB nas próximas eleições, levariam Neves a compor a chapa, ao lado de Serra – na opinião de Mainardi.


É a mesma opinião de Merval Pereira, colunista do jornal O Globo, o maior do Rio de Janeiro, que se reuniu com o Cônsul dia 21/1. Pereira disse ao cônsul que tivera uma conversa com Neves na véspera, na qual Neves dissera estar “firmemente comprometido” a ajudar Serra fosse como fosse, inclusive como vice-presidente, na mesma chapa.


Na opinião de Merval Pereira, uma chapa Serra-Neves venceria. Pereira disse também acreditar que não só Neves aceitará a vice-presidente de Serra, mas, também, que Marina Silva também apoiaria Serra num eventual segundo turno.
(…)


RELAÇÕES PERIGOSAS

Bastante esclarecedor o conteúdo de um dos telegramas mais polêmicos revelados pelo Wikileaks até agora, que mostra como o então candidato a presidente José Serra (PSDB) operou junto a certos membros da imprensa durante as eleições de 2010. E também sobre como jornalistas de veículos notórios por sua oposição ferrenha ao PT se prestam ao papel de correia de transmissão entre o tucanato e o Departamento de Estado norte-americano, compartilhando informações diretas do candidato da oposição e suas previsões sobre o desfecho das eleições brasileiras.

O plantio de informações favoráveis a sua candidatura por parte de Serra em colunas tradicionais de jornais brasileiros é desnudada no diálogo entre os profissionais e o cônsul norte-americano no Rio. Em um dos contatos de um jornalista com o consulado, em janeiro de 2010, o colunista revela que almoçou com Serra e que o candidato disse que Marina Silva (PV) seria sua “companheira de chapa dos sonhos”. Os motivos, de acordo com o que teria dito o tucano, seriam agregar apoio de parte do eleitorado de esquerda, ganhar a simpatia dos pobres e descolar sua imagem da do governo de Fernando Henrique Cardoso.

São exatamente os mesmos argumentos que o colunista publicou a título de análise pessoal em seu espaço em uma revista semanal de grande circulação, na mesma época: o texto foi ditado por Serra, em clara exaltação à possibilidade de que uma “chapa cabocla” fosse capaz de bater o PT nas urnas.

Cabe lembrar que, à época, ainda articulava-se muito fortemente sobre a possibilidade de que o então governador de Minas Gerais e hoje senador Aécio Neves (PSDB) viesse a compor uma “chapa pura” com Serra. O tucano paulista, confiante por estar à frente nas pesquisas de intenção de voto, começou ali a boicotar o colega de sigla –mais carismático e menos centralizador, que ameaçava a posição de Serra como líder do PSDB.

A essência do tipo de política que Serra pratica está nesse trecho de correspondência da diplomacia norte-americana: manipulação de informações por meio de aliados no seio da grande imprensa, maquinações contra aliados e, principalmente, um discurso enganoso para o eleitorado. Afinal, quantas vezes ele protestou quando era acusado de estar tentando esconder a “herança maldita” do governo FHC, do qual foi um dos principais expoentes? Pois disse, ao colunista, que queria Marina como vice; ex-ministra do governo Lula, ela permitiria que ele não fosse identificado como aliado do ex-presidente tucano, mas, sim, um defensor da continuidade do governo petista –o que nunca foi.

A promiscuidade das relações entre Serra, seu partido e parte da grande imprensa é um acinte contra a liberdade de escolha do cidadão, porque o induz ao erro tanto na hora do voto quanto na avaliação do trabalho do governo, a partir do que é publicado nos veículos que abrem mão de critérios éticos de apuração para publicar seus “ditados”.

Temos ciência dessas informações, hoje, graças à internet: em primeiro lugar ao Wikileaks, que vêm prestando relevante serviço público ao divulgar informações confidenciais da diplomacia norte-americana, e em seguida à rede de blogs que trabalha para esfacelar o discurso único, imprimindo pluralidade à comunicação de massas no Brasil.

Nas eleições, quando a central de boatos da oposição estava a mil para atingir Dilma Rousseff com calúnias de toda natureza, foram esses corajosos produtores de informação que desfizeram a trama de mentiras. Agora, consolidados como alternativa para a obtenção de informações, seguem contribuindo para que as práticas mais arcaicas e antiéticas da política brasileira sejam escancaradas ao público e percam a efetividade.

José Dirceu, 64, é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT

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