De como partido político e jornalismo são coisas bem diferentes



do blog jornalismob.wordpress.com

Aconteceu no dia 18 de março, mas veio à tona essa semana. Foi em uma reunião da Fecomércio, o que, por si só, já é sintomático. Judith Brito, essa aí de cima, diretora-superintendente da empresa Folha da Manhã S.A., que edita a Folha de S.Paulo, e presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), teve um lapso (se fosse Dilma, era uma gafe imperdoável, estampada nas capas de jornais, como quando ela erra um nome de cidade, por exemplo, algo bem menos grave).

A escorregada de Judith chega quase a ser bonita. Tem um ar de sinceridade comovente. Ela admite que os jornais agem como partidos, como oposição. Vale citar: “Na situação atual, em que os partidos de oposição estão muito fracos, cabe a nós dos jornais exercer o papel dos partidos. Por isso estamos fazendo [isso]”. Falando em questões éticas, a parte boa da história é admitir. A parte ruim é todo o resto, ou seja, fazer isso.

Afinal, um partido político deve obedecer legislação específica para ele. Tem regras a cumprir. Um jornal tem regras diferentes, obedece a leis diferentes, é registrado de outra forma. Para exercer papel de partido político, é preciso registrar-se como tal e seguir as regras do jogo. Da forma como é feito, a imprensa é não só um partido, mas um partido em posição privilegiada, com acesso a todos os brasileiros de forma direta, através dos meios de comunicação. Não se trata de um partido ter os meios de comunicação nas mãos, mas de ser os próprios. Paradoxal.

As citações de suas falas, retiradas de texto de Jorge Furtado e da própria Folha de S.Paulo, chegam a comover: “esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista (sic) deste país”. Engraçado é que contam para os leitores que fazem jornalismo. Corrijam-me se eu estiver enganada, mas no meu dicionário jornalismo é outra coisa.

Outra questão pertinente levantada por Jorge Furtado é o motivo de a imprensa fazer oposição a Lula e não fazer a Serra. O grave de tudo é que ela admite que os jornais querem alcançar o poder. É feio fazer isso sem concorrer nas eleições. É antidemocrático. E é incoerente criticar políticos por propaganda eleitoral antecipada, por exemplo, e, ao mesmo tempo, fazer propaganda constante para atingir o poder sem sequer tentar oficialmente a via eleitoral. Como funciona esse jogo? Não conheço essas regras, não estão escritas em lugar nenhum. Aliás, observando assim, chegar ao poder sem concorrer nas eleições, leva jeito de golpe.

Isso tudo é o mais grave, de consequências nefastas para a população. Mas é também muito feio fazer tudo isso sem admitir. Por isso que o lapso de Judith Brito ganha um descontinho, mas os jornais continuam em déficit. Porque até agora ainda não admitiram oficialmente que agem com interesses eleitorais. O único veículo da grande imprensa a afirmar apoio a candidatos em eleições é a Carta Capital, mas o faz sem esquecer os interesses jornalísticos que a guiam. O resto, de um modo geral, esquece esses interesses para fazer campanha sem nem comunicar. Tudo invertido.

Agora resta a leitura dos editoriais. Se começarem pelo menos a admitir o apoio a determinados candidatos, estamos evoluindo. Mas, sinceramente, duvido.

* Glória Marinho volta à Globo como repórter na próxima sexta-feira, dia 9, direto da Ásia, no Globo Repórter.

0 Response to "De como partido político e jornalismo são coisas bem diferentes"

2leep.com
powered by Blogger | WordPress by Newwpthemes | Converted by BloggerTheme