Entrevistas com candidatos interessam mais ao "Jornal Nacional" do que à eleição


Mauricio Stycer

As entrevistas realizadas pelo “Jornal Nacional” com Dilma Rousseff, Marina Silva e José Serra provocaram três tipos principais de avaliação: se a performance midiática do candidato foi boa ou não, se falou bobagens ou não e, especialmente, se os dois apresentadores do noticiário agiram bem ou mal como entrevistadores

O primeiro tipo de avaliação não é mais novidade há muito tempo. Eleição é um exercício de convencimento, não de discussão de ideias – saber vender o peixe é muito mais importante do que o peixe em si. Se o candidato foi simpático ou não, se olhou para a câmera ou para os entrevistadores, se parecia calmo ou nervoso, se escolheu as cores certas para a roupa – tudo isso é mais importante do que suas ideias e propostas.

A atenção que se dá aos erros, exageros e mentiras dos candidatos seria útil se ajudasse o eleitor a formar uma opinião sobre o grau de preparo e o caráter de quem pede o voto. Mas, bem adestrados, eles cometem cada vez menos deslizes, o que explica o destaque desproporcional dado a certas bobagens (caso da confusão que Dilma fez ao colocar a Baixada Santista no Estado do Rio).

Mais peculiar, e interessante, é a preocupação geral com a performance de William Bonner e Fátima Bernardes. Para a Globo, dado o seu passivo, é fundamental demonstrar isenção. Isso começa pelo enfoque adotado para as entrevistas. “Vamos abordar aqui temas polêmicos das candidaturas e também confrontar os candidatos com as suas realizações em cargos públicos”, avisou Bonner no dia da entrevista com Dilma.

Qualquer jornalista sabe que a entrevista com um candidato a cargo público deve, obrigatoriamente, abordar temas polêmicos e realizações passadas. É como se Bonner e Fátima, ao advertirem o público e os candidatos antes de cada entrevista, estivessem dizendo: “Atenção, vamos ser jornalistas!” Por que o “JN” faz questão de enfatizar o óbvio?

Outro aspecto que chama a atenção no comportamento da dupla é a preocupação com as “regras” da entrevista, em especial o tempo de sua duração e a explicação de que a ordem das entrevistas obedeceu a um sorteio. Mais uma vez, é uma forma de enfatizar o óbvio: todos os candidatos têm direitos iguais.

Por fim, Bonner e Fátima procuram mostrar isenção sendo duros com os candidatos. Mais uma vez, estamos falando de um comportamento que se espera de qualquer entrevistador, mas cuja receita, no caso das entrevistas do “Jornal Nacional”, desandou. Talvez por falta de cacoete, talvez por nervosismo ou, ainda, por pressão externa, o editor-chefe do “JN” endureceu e perdeu a ternura nas três entrevistas, um pouco mais com Dilma e Marina, dando aos encontros, em algumas passagens, a aparência de interrogatório.

Todo este esforço de mostrar isenção termina por ser o que mais chama a atenção nas entrevistas. O que mais vamos lembrar? Dilma defendeu as alianças do PT com Collor e Jader. Marina disse que permaneceu no PT durante o mensalão para ajudar. Serra elogiou Lula e defendeu a aliança do PSDB com Roberto Jefferson. Alguma surpresa? Alguma novidade?

Resta, portanto, ao espectador com interesse político apenas discutir se o “Jornal Nacional”, neste seu esforço hercúleo de parecer isento, alcançou seu objetivo. Não está em discussão se foi, ou não, imparcial – mas se conseguiu convencer quem o assiste disso.

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