Salvo se o acaso fizer surpresa

Boa parte do voto em Marina é daqueles que não querem ver Lula e Dilma arrotando grandeza desde já.
Querem que eles sofram pelo menos um pouquinho.
Em um eventual segundo turno entre Dilma e Serra, votarão em Dilma.

Ricardo Noblat

Cansei de ouvir quando era criança, morava no Recife e a apuração de votos se arrastava por dias ou até semanas:

- Espere a chegada da Zona da Mata para ver só...

Pernambuco tinha Recife, Zona da Mata, Agreste e Sertão. As usinas de açúcar concentravam-se na Zona da Mata, a região socialmente mais desigual. O açúcar era a grande riqueza do Estado.



Quando faltavam votos à esquerda no Recife para que vencesse eleições, dizia-se que ela seria salva pelos votos da Zona da Mata. Era o voto anti-usineiro. E nada havia de mais reacionário ou conservador do que um usineiro.

Em 1998, quando Fernando Henrique Cardoso se reelegeu presidente, escapando por poucos votos de ser obrigado a disputar o segundo turno contra Lula, ouvi com freqüência em Brasília:

- E se chover nos grotões do Nordeste onde o governo é mais forte?

Deve chover muito, hoje, em boa parte do país. Talvez a abstenção cresça nas áreas mais remotas.

De resto, se uma fatia expressiva dos eleitores esquecer que só poderá votar munida de um documento oficial com foto?

Olha o segundo turno aí, gente!

Bobagem!

Quer segundo turno sem depender do imponderável que jamais decidiu eleição por aqui?

Torça para que o número de votos de Dilma seja menor do que a soma dos votos dos seus adversários. É simples assim.

Na noite da última sexta-feira, prevalecia um “nervosismo tranqüilo” no coração da campanha da Dilma. Pesquisas aplicadas em tempo real mostravam uma leve redução da vantagem dela.

Dilma perdia um pouco de votos. Marina Silva ganhava votos. E Serra crescia devagar em São Paulo, aonde Dilma chegara a ter 15 pontos percentuais de votos a mais do que ele. Os 15 pontos reduziram-se a três.

Na noite do sábado, depois que o Ibope e o Datafolha deram a eleição por empatada entre Dilma e a soma das intenções de voto dos seus adversários, o "nervosismo" perdeu o que aparentava de tranquilidade.

Um mimo para os que tentam explicar resultados eleitorais com base na geografia: em 2002, Serra derrotou Lula em São Paulo no primeiro turno. E perdeu ali no segundo. Em 2006, Alckmin venceu Lula em São Paulo no primeiro e no segundo turnos.

Atribua-se a São Paulo, pois, o mau desempenho de Serra na eleição deste ano. Certo? Errado. Serra foi mal na maioria dos Estados. Espera ser salvo por Marina.

Acabou-se o mimo.

Dilma, hoje, vencerá a eleição. E se tiver que confirmar sua vitória no segundo turno, deverá fazê-lo sem maior dificuldade.

Boa parte do voto em Marina é daqueles que não querem ver Lula e Dilma arrotando grandeza desde já.

Querem que eles sofram pelo menos um pouquinho.

Em um eventual segundo turno entre Dilma e Serra, votarão em Dilma.

Alckmin teve menos votos no segundo turno de 2006 do que no primeiro.

Esqueçam a lenda de que segundo turno é uma nova eleição. Não é – salvo se o acaso fizer uma surpresa.

Não costuma fazer.

Em 1994, houve segundo turno para governador em 18 Estados. Em seis deles, o candidato segundo colocado no primeiro turno virou o jogo.

Em 1998, foram 13 com quatro viradas.

Em 2002, 14. Viradas? Apenas três.

Por fim, em 2006, houve segundo turno em 10 estados. Com viradas em três.

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