Analista avalia que hipótese de partido único não se sustenta


Professor entende que episódio da Receita faz parte de fenômenos sociológicos recorrentes no mundo e que envolvem mídia e política.

Por João Peres, Rede Brasil Atual 

A hipótese aventada por colunistas políticos e alguns dos jornais de maior circulação sobre a existência de um quadro de partido único no pós-eleição no Brasil não encontra qualquer respaldo na realidade. André Singer, cientista político da Universidade de São Paulo (USP), lembra que se trata de uma corrente de pensamento que surge com recorrência no país. “Tende a ser mais uma conversa que no período pós-eleitoral não vai se confirmar”, resume.
Em 1986, quando o PMDB ganhou as eleições em quase a totalidade dos estados, falou-se também na “mexicanização” da política brasileira. Trata-se de um temor de que se viva uma situação similar à do México, que teve um partido hegemônico – o PRI – durante a maior parte do século XX. A questão começou a ser levantada pelos jornais, e logo ganhou as colunas de opinião, devido à possibilidade de crescimento do PT nas atuais eleições graças ao prestígio do presidente Lula e à boa reputação do atual governo.
Até mesmo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a escrever um artigo intitulado “Democracia virtual”, publicado em O Estado de S. Paulo, no qual falou sobre o eventual risco do enfraquecimento da oposição. “Dadas as características da cultura política brasileira, de leniência com a transgressão e criatividade para simular, o jogo pluripartidário pode ser mantido na aparência, enquanto na essência se venha a ter um partido para valer e outro(s) para sempre se opor, como durante o autoritarismo militar”, escreveu.
André Singer entende que não há qualquer fato que fundamente essa linha de pensamento. “É claro que o PT está passando por um processo de fortalecimento, que é normal porque ele participou de um governo muito bem sucedido. Mas minha impressão é de que do ponto de vista científico não há nada que sustente a tese da mexicanização. Tende a ser mais uma conversa de período pós-eleitoral que não vai se confirmar.”

Político-midiático

O professor acrescenta que o atual episódio de violação de sigilo de pessoas ligadas a José Serra faz parte de um escândalo político-midiático que tem se repetido em momentos de acirramento político. Tal fato se tornou comum desde Watergate, escândalo de 1972 que derrubou o presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon.
“Como o próprio nome diz, envolve os meios de comunicação. É todo um sistema que está em funcionamento não só no Brasil, mas em todos os processos democráticos. Esse é um aspecto que a gente tem que estudar bem, tem que ser bem compreendido, porque tem repercussões sobre a democracia”, ressalta, lembrando as relações entre os meios de comunicação e os interesses de grupos políticos.
O episódio da Receita tem dominado o noticiário eleitoral nas últimas semanas. A conta-gotas vão sendo divulgados os nomes de pessoas que tiveram o sigilo violado, o que mantém o tema em debate acalorado no qual há acusações de ligação da candidata do PT, Dilma Rousseff, com o caso. E sobram declarações conectando a ética petista à ética do fascismo e falando em um governo “fora da lei”, além de falas sobre o “retrocesso” e o enfraquecimento da democracia brasileira.
Para Singer, trata-se de um acirramento comum em momento de campanha. “Claro que, se esse tipo de retórica continuar, pode dar ensejo a uma visão golpista. Não posso afirmar que isso não vai acontecer, mas tendo a achar que não é essa a tendência mais provável. As instituições brasileiras estão funcionando e estão num processo de consolidação. Passado o ambiente eleitoral, a tendência é as pessoas se guiarem por um certo bom senso.”

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